Com a bancarrota de grandes construtoras (2012/2014), em nossa capital, dezenas de empreendimentos foram abandonados ou sequer tiveram suas obras iniciadas. Como reflexo, milhares de famílias vivenciaram o drama de não receber sua casa própria e, para muitos, a perda de todas suas economias. Em nosso escritório, recebemos dezenas de clientes que, em razão do prejuízo sofrido, não possuíam mais condições de comprar outro imóvel.
A solução para minimizar o prejuízo ou recuperar o capital investido é dada pelo inciso VI, do artigo 43, da Lei Federal n° 4.561/64 (Lei de Incorporações), que autoriza os compradores a tomar a obra com a finalidade de concluí-la, por meio do procedimento de destituição da construtora/incorporadora.
Nosso escritório assessora diversas comissões de compradores nesta situação, mas sabíamos, desde o início, que esta seria somente a primeira etapa de um processo intricado e complexo, seja pela questão financeira, bem como pelo vencimento dos alvarás de construção, já que a nova Lei de Uso e Ocupação do Solo (2010) reduziu o potencial construtivo dos terrenos em toda cidade.
Assim, não seria mais possível, a princípio, a edificação dos prédios com a mesma quantidade de unidades, anteriormente comercializadas.
Ante a nova restrição legal caberia aos compradores/condôminos pagar pela Outorga Onerosa do Direito de Construir para obter a renovação do alvará de acordo ao projeto arquitetônico aprovado anteriormente, o que na prática encarece, sobremaneira, o empreendimento tornando-o inviável em muitos casos.
Um dos empreendimentos – condomínio em construção – pagou a quantia de R$627.591,00 (seiscentos e vinte e sete mil e quinhentos e noventa e um reais), parcelando o débito em 180 parcelas mensais. Valor suficiente para construir quase três unidades do empreendimento.
É a partir deste cenário que o então Vereador Sérgio Fernando de Pinho Tavares (PV) idealizou um projeto de Lei que pudesse viabilizar uma solução para os milhares de compradores lesados, convidando o nosso escritório para auxiliá-lo na estruturação do projeto.
O grande dilema era criar uma lei municipal que atendesse as necessidades dessas famílias e, ao mesmo tempo, não confrontasse a Constituição/88 e as legislações federais e municipal.
Assim, o projeto de lei focou na alteração do artigo 19, da Lei Municipal 9.725/09 (Código de Obras), como forma de viabilizar a renovação do alvará de construção sem a obrigatoriedade do pagamento da outorga onerosa quando cumpridos certos requisitos, como: a) paralisação injustificada da obra; destituição do incorporador nos termos da Lei Federal; recuperação judicial ou falência da construtora.
Importante ressaltar, a alteração do Código de Obras permite a renovação de alvará para empreendimentos já iniciados e, também, para aqueles que sequer saíram da planta.
Com a vigência da Lei, as esperanças dos compradores foram renovadas, justamente por terem um aparo normativo capaz de viabilizar os empreendimentos de forma jurídico-financeira.
Vale lembrar, a Lei também cria o impedimento do direito de construir por 05 anos aquele construtor que tenha sido destituído da obra por paralisação injustificada.
DA ADIN 1.0000.16.097241-0/000 DA DISCUSSÃO JUDICIAL PROPOSTA PELA PBH
Preocupada com a questão arrecadatória a PBH, por meio de sua procuradoria, propôs, no ano de 2016, perante o TJMG, uma Ação Direta de Inconstitucionalidade, alegando, em síntese, que a iniciativa do projeto deveria ser do Executivo e, ainda, não poderia sofrer com a perda da receita ao deixar de cobrar a Outorga.
A Prefeitura sofreu sua primeira derrota judicial com o indeferimento da liminar visando suspender, de imediato, os efeitos da Lei. Em sua decisão, o TJMG entendeu que não haveria prejuízos substanciais ao Município, já que os compradores somente desejavam renovar projeto anteriormente aceito.
Em 28 de fevereiro de 2018, o TJMG julgou improcedente a ação direta de inconstitucionalidade, reconhecendo sua validade perante nosso sistema legal, bem como ser direito dos compradores a renovação do alvará.
A Procuradoria do Município poderá recorrer da decisão ao STJ. Porém, caso o faça, todas as associações de compradores lesados poderão atuar no processo em defesa da manutenção da Lei, como amicus curiae, ou seja, ainda que não sejam partes na ação podem e devem se manifestar nos autos em defesa da Lei n° 11.002/16.
Tiago Cunha
Advogado especialista e Direito Imobiliário
Ex-Membro da Comissão de Direito Imobiliário da OAB/MG
Consultor em Incorporações e Negócios Imobiliários
Consultor em Gestão e Administração de Condomínio